CARTA ABERTA AOS CANDIDATOS

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O Centro de Direitos Humanos e Memória Popular de Foz do Iguaçu, entidade de caráter civil, com personalidade jurídica própria, fundado em 1990, e reconhecido oficialmente como de utilidade pública pelo Decreto Municipal nº 4192, vem a público encaminhar suas considerações e propostas aos candidatos a cargos eletivos.
As eleições de 2018 ocorrerão num contexto de profunda crise econômica e institucional, em boa parte causada pela implantação de políticas neoliberais e pelos contínuos atropelos aos direitos fundamentais.
Passados um ano e oito meses de sua promulgação, a Emenda Constitucional 95 já demonstra o seu potencial de dano, com o aprofundando das desigualdades socioeconômicas e impactos desproporcionais, sobretudo para aqueles já em situação de vulnerabilidade.
A Relatoria Especial das Nações Unidas sobre a Extrema Pobreza e Direitos Humanos considera a EC 95 como “uma medida radical, desprovida de nuance e compaixão”. Informa ainda a Relatoria da ONU, que se persistirem as atuais medidas de austeridade fiscal o país poderá ter 20 mil mortes a mais de crianças até 2030.
Por outro lado, dados publicados no Atlas da Violência 2018, e divulgados pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), anunciam uma situação de 30,3 homicídios para cada 100 mil habitantes, a maior taxa já registrada no Brasil.
O Brasil é um país historicamente marcado por sistemáticas e graves violações aos direitos humanos.
Dentre suas principais violências fundadoras, estão o genocídio dos povos indígenas, escravidão dos povos negros, e as sistemáticas e graves violações aos direitos humanos e civis praticadas pela ditadura militar.
Conforme relatórios da sociedade civil. há um genocídio da população jovem e negra, assim como a permanência e aprofundamento de profundas desigualdades sociais.
No âmbito rural a concentração de terra e a pendência de uma reforma agrária perduram sistemáticas violações aos camponeses na disputa por uma fração de terra.
Além disso, a tortura sistemática como método de repressão, segue sendo praticada por agentes estatais de segurança pública. Toda operação estatal exige proporcionalidade entre o ato e o fato, em respeito ao direto à intimidade e à honra, de caráter inviolável, atemporal e universal. Mas de tão usual, a violência como instrumento da força bruta, o morador humilde acaba acreditando não ter direito à vida, nem ao respeito à sua dignidade.
Sucessivos relatórios de entidades da Sociedade Civil Organizada concluem que a polícia faz uso desnecessário e excessivo da força, agindo com violência e abusos contra a população, que incluem agressões e buscas ilegais em residências e homicídios, muitas vezes camuflados pelo famigerado “auto de resistência”, que acaba induzindo a Justiça ao erro. A Justiça, quase sempre, acredita na versão da polícia, mesmo quando as evidências mostram o contrário.
Ainda no campo da violência, é importante assumir que a polícia brasileira não é apenas a que mais mata, mas também a que mais morre no cenário mundial. O modelo militar, herdado da ditadura, os submete a métodos de treinamento desumanos e cruéis.
Dessa maneira, o país é um caso emblemático de um passado, e mais, de um presente, de graves violações que precisam ser enfrentadas de forma estrutural.
De todos os eventos históricos de violência, o Estado foi o grande protagonista de graves violações de direitos humanos. Especialmente, por seu poder de monopólio legal da violência, instituições e agentes públicos ligados às Forças Armadas, às polícias militares, às policias civis e ao Poder Judiciário, incluindo a Magistratura e o Ministério Público, são as instituições diretamente envolvidas em violações aos direitos humanos no Brasil, no passado e no presente.
Partindo dessas considerações, apresentamos diretrizes, a serem equacionadas em projetos e programas, que tenham como objetivos o aperfeiçoamento do Estado Democrático de Direito, e garantias de não repetição das violações dos direitos humanos:
PROPOSTAS DE COMPROMISSOS
1. Imediata revogação da Emenda Constitucional 95 e retomada de uma agenda positiva de investimentos, na saúde, educação, cultura e moradia.
2. Estabelecer uma Política Nacional de Memória, que envolva todos os níveis de governo, tendo como objetivo ações de proteção e promoção da memória nacional, oferecendo condições de funcionamento a museus, arquivos e bibliotecas.
3. Criação de um plano que viabilize a revisão da denominação de logradouros públicos, praças e monumentos que homenageiam autores, coautores ou colaboradores das graves violações aos direitos humanos.
4. Inclusão nos três níveis de ensino regular e nos currículos das academias militares, de projetos pedagógicos voltados para a defesa dos direitos humanos.
5. Política Nacional de erradicação da prática de tortura, ampliando e fortalecendo os atuais mecanismos de combate e prevenção à tortura, com responsabilização – criminal civil e administrativa – de agentes do Estado.
6. Reforma do Sistema de Segurança, contendo como preocupação central que as instituições do Estado, consideradas responsáveis pelo uso legal da força – especialmente as Polícias e as Forças Armadas, interrompam ou não voltem a cometer violações aos direitos humanos, sejam contra a população ou membros de seu próprio quadro, e se tornem instituições confiáveis para a cidadania e para o regime democrático.
7. Reforma do sistema prisional com atenção aos direitos humanos dos apenados e sua reinserção na sociedade.
8. Quanto ao Direito à saúde é imprescindível que o seu financiamento seja duradouro, justo e adequado para um atendimento digno à população. Para isso é necessário uma posição pública contrária às medidas ¬fiscais e econômicas, em especial, à Emenda Constitucional 95/2016, do “teto de gastos”, que asfi¬xia por 20 anos e fere de morte o SUS e outras políticas sociais.
9. Fortalecimento e defesa do SUS, como condição indispensável para o fortalecimento da soberania nacional, da democracia e da diminuição da desigualdade.
10. Garantir que o Estado proporcione segurança e proteção às populações indígenas, quilombolas, ribeirinhas; lésbica, gay, bissexual, travesti e transexual (LGBT); negras, urbanas, rurais, moradores de rua, pessoas com de¬ficiência e demais populações em vulnerabilidade, comprometendo-se também no reconhecimento do nome social em todas as áreas, sobretudo no âmbito da saúde.
11. Implantação de uma Auditoria da Dívida Pública e de reformas tributária e fiscal, que venham garantir uma justiça tributária, elevando impostos sobre renda e propriedade e reduzindo a taxação sobre o consumo.
12. Salário digno para todos os trabalhadores e correção do salário mínimo de acordo com a tabela do Dieese.
13. Luta pela implantação urgente de planos de cargos e carreiras, em todos os sistemas de ensino.
14. Luta incessante contra toda forma de cerceamento à liberdade de pensamento, projetos excludentes e conservadores, que ferem a autonomia das instituições educativas, tanto da educação básica, quanto na educação superior.
15. Luta contra a atual proposta de Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que exclui temas sociais sensíveis, como a discussão de gênero, e engessa e homogeneíza o currículo.
16. Luta contra a proposta “Escola Sem Partido”, que visa exclusivamente tolher a liberdade de expressão criando clima de terror dentro das instituições de ensino.
17. Luta contra a “Reforma do Ensino Médio” em curso, que reduz o currículo, limitando o acesso dos jovens e adultos da classe trabalhadora à ciência, à cultura, e às tecnologias, historicamente produzidas pela humanidade.
18. Luta contra a aprovação da Reforma da Previdência.
19. Luta pela revogação da Reforma Trabalhista.
20. Luta pelo fim da terceirização e de todos os ataques aos direitos trabalhistas.
21- Promoções e fortalecimento de políticas de integração Latino Americana seguindo o que estabelece a Constituição Federal, em especial o PARLASUL.
22- Fortalecimento de ações que visam a defesa dos direitos humanos na América Latina como descrito no IPPDH (Instituto de Políticas Públicas em Direitos Humanos do Mercosul).
23- Comprometimento com a ratificação dos acordos internacionais assumidos pelo país no campo dos Direitos Humanos.
24- Implementação do direito à demarcação das terras indígenas e quilombolas e realização de uma reforma agrária ampla e popular, com incentivos à produção agroecológica e à comercialização de alimentos saudáveis para toda a população brasileira.
25. Reversão das privatizações executadas e fortalecimentos das empresas públicas.
26. Realização de uma Auditoria Cidadã da Dívida Pública, que consome aproximadamente metade de todo o orçamento público brasileiro.
27. Retomada dos programas sociais nos moldes anteriores a 2016, reforçando-os e universalizando-os.
28. Respeito à presunção da inocência e a Constituição que garante que a prisão somente deve ocorrer quando todos os recursos e instâncias tenham se esgotado. Os princípios constitucionais, alicerces do sistema jurídico, devem ser observados e respeitados, em razão de terem como hábitat natural a Lei Maior.
29. Ampla Reforma do Estado, que estimule mecanismos de participação direta, promova a democratização e a pluralidade dos meios de comunicação.
Centro de Direitos Humanos e Memória Popular de Foz do Iguaçu
01 de Setembro do ano de 2018.